quarta-feira, dezembro 12, 2007

Viva Noel!


"Seu garçom faça o favor de me trazer depressa / Uma boa média que não seja requentada / Um pão bem quente com manteiga à beça / Um guardanapo e um copo d'água bem gelada / Feche a porta da direita com muito cuidado / Que eu não estou disposto a ficar exposto ao sol / Vá perguntar ao seu freguês do lado / Qual foi o resultado do futebol."


Esse é um trecho da composição "Conversa de Botequim", de Noel Rosa e Vadico, que retrata, de forma saborosa, a vida boêmia do Rio de Janeiro. Noel Rosa nasceu no bairro de Vila Isabel, no Rio de Janeiro, que se tornou célebre através de suas músicas. Sua mãe teve um parto difícil e o médico precisou usar fórceps, o que teria causado seu problema no queixo, pouco proeminente. Noel cresceu franzino e doentio. Apesar disso, desde a adolescência interessou-se pela vida boêmia, freqüentando rodas de samba. Aprendeu a tocar bandolim com sua mãe, adotando depois o violão, que aprendeu a tocar com o pai, como seu instrumento. Em 1927, Noel fundou, com os compositores Almirante e Braguinha, o Bando dos Tangarás. Nesse ano, criou suas primeiras composições, "Minha Viola" e "Festa no Céu". Entrou para a Faculdade Nacional de Medicina em 1930, que abandonou dois anos depois. Em 1931, a composição "Com que Roupa?" tornou-se um grande sucesso no Carnaval. Durante a década de 1930, Noel Rosa tornou-se um compositor extremamente criativo e protagonizou uma carreira vertiginosa, com mais de uma centena de composições, entre sambas e marchinhas. Trabalhou com dezenas de parceiros. Foi nessa década que compôs os sucessos "Feitiço da Vila", "Filosofia", "Fita Amarela", "Gago Apaixonado", "O x do Problema", "Palpite Infeliz" e "Pra que Mentir". Noel Rosa vendeu suas músicas para outros cantores, tornando-se conhecido no rádio, pelas vozes de cantores como Araci de Almeida, Mário Reis e Francisco Alves. Além de serem crônicas da vida carioca, as letras bem elaboradas de Noel Rosa tematizaram o amor. Em 1934 o poeta apaixonou-se por Ceci, que conheceu numa festa junina. No fim desse ano, no entanto, acabou casando-se com Lindaura. Doente de tuberculose, Noel Rosa passou uma temporada em Belo Horizonte, em busca de tratamento, voltando depois ao Rio de Janeiro. Continuou levando a vida nos bares, bebendo e fumando. Apresentava-se em programas de rádio e fazia recitais e apresentações públicas. Em 1935, ainda viu duas composições suas estrearem no cinema, no filme "Alô, Alô Carnaval". Noel tinha apenas 26 anos quando faleceu em sua casa, no bairro de Vila Isabel e hoje, dia 11 de dezembro de 2007, se estivesse vivo, estaria completando 97 anos de vida. Viva Noel!

domingo, dezembro 09, 2007

Entrevista com Roberta Sá


Ela é sem sombra de dúvidas uma das principais vozes da Música Popular Brasileira atualmente. Em uma curta e vitoriosa carreira, a cantora potiguar radicada desde a infância no Rio de Janeiro, Roberta Sá, está lançando seu segundo álbum intitulado "Que belo estranho dia para se ter alegria".

Salve a Mpb: Roberta, para começar esse bate-papo, gostaria que você explicasse o que é esse belo estranho dia para ser ter alegria que dá nome ao seu CD?

Roberta Sá: Esse belo estranho dia é o dia que a gente vive. É o nosso dia-a-dia. É essa coisa de buscar a alegria dentro do caos das cidades e do mundo, na verdade.

Salve a Mpb: Assim como em seu primeiro CD, o segundo é total sucesso de crítica. Qual é a essência desse trabalho tão bem sucedido?

Roberta Sá: Eu acho que a essência dos trabalhos são as parcerias que eu consegui conquistar com o Rodrigo Campello (produtor musical), com o Felipe Abreu (preparador vocal) e com o João Mário Linhares (empresário).

Salve a Mpb: Roberta, hoje em dia a gente acaba se deparando com uma falta de educação generalizada no mundo. Ninguém mais fala bom dia, boa tarde, dá licença, obrigado e a frase eu te amo se banalizou. O conteúdo do seu CD trata muito desse nosso cotidiano. Como você analisa isso? Esse tratamento foi intencional na montagem do CD?

Roberta Sá: Foi completamente intencional, mas ao mesmo tempo, acho que o disco tem uma visão bem humorada dessas questões. A gente resolveu tratar desses assuntos, mas com otimismo, porque realmente as pessoas não falam bom dia, o trânsito está cada vez mais uma loucura, ninguém dá mais passagem pra ninguém, ninguém mais pára no sinal vermelho, falta paciência, falta compaixão, falta muita coisa, mas eu acho que tem muita gente que está acordando para isso. E o disco fala disso também, é uma visão otimista, uma visão de que as coisas podem melhorar e de que a gente pode passar por essas questões com leveza, se divertindo ainda e sendo feliz.

Salve a Mpb: Comparando seus dois álbuns, você acha que houve um amadurecimento pessoal e musical em tudo que vem acontecendo e de tudo que aconteceu de um CD para o outro ou vem sendo uma continuidade do seu trabalho?

Roberta Sá: Eu acho que as duas coisas. O amadurecimento vem dessa continuidade, uma continuidade de estar trabalhando com os mesmo parceiros, de ter podido durante esses dois anos desenvolver uma intimidade maior com as pessoas, com os músicos que trabalharam nesse disco e com os compositores que já estavam presentes no disco anterior. Então, é um amadurecimento dessas parcerias e também da continuidade de um trabalho, de uma linha de trabalho. Tanto que os repertórios dos dois discos, apesar de serem completamente diferentes, eles conversam, eles fazem parte de um universo musical, que é um universo dessas pessoas todas que se envolveram com esse trabalho.

Salve a Mpb: Roberta, há quase três anos, eu tive a oportunidade de entrevistar você, bem no começo da sua carreira, e você me dizia que em um país onde se tem compositores como Chico Buarque, Caetano Veloso, Tom Jobim, Dorival Caymmi entre tantos outros tão grandes, quem quisesse compor algo, teria que fazer algo pelo menos igual ou melhor do que eles. Você defendia também a questão da intérprete, ou seja, quem se dedicasse exclusivamente a cantar. Nesse disco você se lança como compositora em parceria com Pedro Luís com a música "Janeiros". Explica pra gente essa novidade.

Roberta Sá: Bom, primeiro eu não me considero compositora só porque eu fiz uma canção. Essa canção foi uma das últimas a entrar no disco e eu não me considero compositora só por causa dela. Compositora é aquela pessoa que o ofício dela é escrever e compor, ela se dedica a isso. Então, não é o meu caso não é, e muito provavelmente não vai ser, embora eu ache que não se possa negar uma inspiração que apareça, e a única coisa que eu fiz foi não negar uma inspiração que me veio e concluir uma canção com meu parceiro Pedro Luís. Eu ainda me considero uma intérprete, ainda é a minha essência escolher e colher canções para cantar, colher compositores e escolher esses compositores, esse é o meu ofício, é a isso que me dedico. Tenho que encontrar a melhor maneira de cantar essas canções que eu escolhi. E para esse disco eu apenas escolhi uma canção que era minha, ela também foi escolhida, ela também faz parte do meu trabalho de intérprete. Eu acho que o Brasil tem uma tradição de compositores geniais e que a gente tem que se orgulhar e se inspirar neles, mas ao mesmo tempo a gente não pode para de produzir, deixando com que isso trave a criatividade da gente, senão a gente não anda pra frente, só fica olhando pra trás. Eu acho importantíssimo olhar pra trás, inclusive é um hábito meu olhar pra música, olhar para os grandes compositores e para os grandes intérpretes, mas para crescer, para ir para frente.

Salve a Mpb: Já que você tocou nesse ponto de compositores e de olhar para trás, nos anos 60 e 70, Nara Leão ficou marcada além da bela voz, por ser responsável pelo lançamento em âmbito nacional de compositores como Chico Buarque, Zé Kéti e Sidney Miller entre outros. Você acha que podemos colocar você em situação parecida hoje em dia, ao dar a voz e oportunidade às canções de Lula Queiroga, Edu Krieger, Rodrigo Maranhão e Roque Ferreira?

Roberta Sá: Olha, eu ficaria muito orgulhosa se isso fosse verdade. A gente não tem o distanciamento para dizer o que qualquer pessoa que está vivendo hoje representa para a música brasileira. Tomara que isso seja verdade, pois me deixaria muito orgulhosa. O que eu tento como intérprete, não só como intérprete de canções, mas também como intérprete do meu tempo, intérprete do mundo de hoje, pelo menos da cena que eu vivo, da minha aldeia, que é o Rio de Janeiro e os lugares que eu conheço, eu tento traduzir isso através dos compositores que eu conheço e que eu admiro, mas não sei se eu posso ser uma Nara. Nossa, eu ficaria orgulhosíssima, pois eu acho a Nara, inclusive, de extrema importância para a música brasileira. Tomara que eu tenha pelo menos um terço da importância que ela teve.

Salve a Mpb: Você tem intenção em gravar um CD homenageando um único compositor, seja ele da nova geração ou alguém já consagrado?

Roberta Sá: Tenho. Tenho, sim. Existe até um projeto. Eu tenho uma parceira muito forte com o Trio Madeira Brasil, uma parceria muito grande, que vem lá trás, desde o lançamento do meu primeiro disco e, a partir daí ficamos amigos e parceiros musicais, a gente se identifica muito, é muito fácil pra gente trabalhar junto. Então, a gente tem esse projeto de fazer esse disco juntos, mas a nossa idéia principal era de fazer um disco só com canções do Roque Ferreira, que é um compositor que foi muito generoso comigo, pois quando eu pedi uma canção pra ele, ele me mandou vinte, depois me mandou mais dez, então eu tenho um repertório do Roque muito grande e eu tenho vontade de colocar isso em disco junto com o Trio Madeira Brasil, porque o Roque merece, ele é um grande compositor, ele merece ter o nome dele ligado a uma obra com o nome dele, ele merece essa homenagem. Vamos ver quando isso vai acontecer, posso dizer que é uma coisa mais pra frente, mas que eu tenho muita vontade de fazer, sim.

Salve a Mpb: Roberta, gostaria muito de agradecer por esse bate-papo e desejar que você continue nesse caminho de sucesso, com essa simpatia e todo esse talento. Muito obrigado.

Roberta Sá: Obrigada a você, Cesar. Muito sucesso para você e, quando precisar, é só chamar. Beijo grande.